Nego Drama

quinta-feira, 26 de maio de 2022

Um corpo negro, um homem fardado, um camburão (ou a câmara de gás)


André Luis Pereira


Qualquer pessoa Preta sabe o terror que é imaginar uma abordagem policial, aqui no Sul chamamos “atraque”. Mesmo aqueles e aquelas que nunca passaram por isso conhecem o protocolo: “Mão na cabeça”, “olhar para o chão”, no momento da revista abrir bem as pernas, só responder se perguntado, em hipótese alguma olhar no rosto do sujeito de farda, porque ele tem uma arma na mão e está louco para apertar aquele gatilho. O consórcio firmado entre o bolsonarismo e as forças de segurança pública tem gerado cenários como os vistos no Rio de Janeiro, em Sergipe ou em qualquer lugar desse país onde haja as polícias, militar ou civil, operando. O caso das polícias federais PF e PRF é emblemático. Sócias de primeira hora do atual governo, tem buscado demonstrar lealdade “cega” à barbárie provocada por este projeto de sociedade. É verdade que toda a generalização é burra, e neste caso arriscada, pois há profissionais de segurança pública comprometidos com a justiça e o bem comum. No entanto, no projeto genocida em curso, gente preta, pobre, que mora nas periferias e nas ruas e considerada gente descartável, corpos matáveis, na acepção de Achille Mbembe (necropolítica). Todos os dias, nós, pessoas Pretas, quando saímos de casa temos um alvo fixo preso aos nossos corpos. E não interessa se tem emprego, se tem formação, se é sujeito ou cidadão, sendo Preto é passível do camburão. E o camburão agora foi atualizado. Uma câmara de gás sobre rodas, a atualização da tortura. Mas esse camburão tem seus alvos preferenciais. Se você é Preta ou Preto e anda na rua, independente do seu status social, você é o alvo. Repito, você é o alvo. Duvido que uma ação policial de mesma natureza das perpetradas no RJ e SE, nas periferias, como acontece na maioria das cidades, chegue aos bairros de classe média alta ou mesmo aos condomínios encastelados. Nestes a polícia não chega, porque afinal a casta que domina tais espaços tem a pele alva, como a “brancura da pureza”. Eu não espero nada das polícias além de violência. Temo pelas pessoas que, eventualmente, possam estar comigo num “atraque”, sendo brancas. As pessoas não-negras e de pele clara neste país não têm ideia do trauma que é uma arma de calibre 12” apontada para o seu peito ou seu rosto. Não imaginam por quantos anos a figura, os olhos, a voz do elemento fardado ronda os teus pensamentos. A polícia no Brasil mata e mata muita gente Preta, porque gente Preta é “matável” e “morrível”, no país do racismo cordial e da democracia racial. Porque, afinal, os meios empregados são, no dizer deles: “os mais adequados à contenção e que buscam evitar danos irreversíveis”. Em 2 dias as polícias militares, civis e PRF assassinaram 30 pessoas, em sua maioria Pretas, periféricas, sem possibilidade de defesa. Uma imagem não me sai da cabeça: Todos os dias uma pessoa Preta e outra fardada saem à rua, se se encontrarem a possibilidade da primeira morrer, vítima de ação da segunda é sempre e cada vez maior”. E no final de tudo nós sabemos que ainda vai morrer muita gente Preta, porque afinal, “a carne mais barata do mercado é a carne negra”.

Por: André Luis Pereira

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